«O que queres ser quando fores grande?» O leque de respostas é imenso. Das mais comuns como «Quero ser médico»; «Quero ser professora»; «Quero ser jogador de futebol» às certezas mais surrealistas como «Quero ser astronauta!», «Quero ser princesa…», as crianças têm o dom de nos surpreender e de darem asas à imaginação. No entanto, independentemente de quão criativas sejam, raramente somos confrontados com um inocente: «Quero ser tradutor».
No meu caso, sempre soube que tinha de trabalhar na área das línguas, mas nunca soube muito bem em quê. Quando finalmente decidi ser tradutora, já não havia margem para inocências. Então, o que fazer quando a decisão de se querer ser tradutor é refletida e séria?
Para muitos, este ponto poderá parecer irrelevante. É que, para traduzir, não basta conhecer muito bem duas línguas. É necessário conhecer muito bem duas realidades. Sem este domínio, o tradutor estará inevitavelmente “agarrado” ao original, não conseguindo transpor de forma clara e fiel a mensagem pretendida. Este desprendimento textual é conseguido através de uma série de técnicas de tradução que se aprendem numa formação académica adequada. A verdade é que nem todas as pessoas que sabem duas línguas conseguem traduzir bem, é necessário aprender. Por isso, certifique-se de que tem uma boa formação. Caso contrário, correrá o risco de ver “chover cães e gatos” sem ninguém saber muito bem para onde fugir!
O cartão de identidade de qualquer “caloiro” no mundo do trabalho é o curriculum vitae. Por isso, se já possui os conhecimentos adequados e está em início de carreira, dedique algum tempo a elaborar um bom CV. Facilmente encontrará na Internet alguns guias e orientações sobre como elaborar um CV. Existem vários modelos à escolha. Pense em toda a experiência e nos conhecimentos relevantes que foi adquirindo ao longo dos anos e apresente-se. Não há limites para a criatividade…
Se quer começar por algum lado, traduza! Como em qualquer profissão, a experiência vale ouro, por isso, dê aos dedos. Procure. Envie currículos. Aceite projetos. Se esperar pelos grandes desafios ou pelos desafios mais interessantes, poderá nunca chegar lá. Esses demoram tempo. Nunca é fácil começar; por isso, é fundamental que se dê a conhecer e ganhe experiência. Hoje poderá não ter trabalho, amanhã terá um projeto, depois dois, três… Quando se aperceber, não serão projetos, mas clientes fixos. A tradução pode ser um trabalho solitário por um lado, mas não tem, nem deve ter, barreiras físicas que o impeçam de comunicar. Ganhe experiência, contactos, conhecimentos novos; em suma, conquiste a confiança dos seus futuros clientes. Traduza e verá que, além de fazer bem ao currículo, também faz bem à carteira.
Se tiver dúvidas, pergunte; se não tiver… pergunte também! Um bom tradutor tem de ser curioso, ávido por conhecimento, um eterno estudante. Sempre rodeado por livros, artigos, manuais de referência, dicionários – estes têm de ser o melhor amigo do tradutor. Se não souber como se diz uma determinada expressão ou o que significa um termo no texto de origem, contacte um especialista da área. Está a trabalhar num texto jurídico? Nesse caso, poderá querer aconselhar-se com um advogado. Fala de termos médicos? Contacte um médico. Tem dúvidas sobre o projeto? Fale com o cliente. Um trabalho de parceria é sinónimo de profissionalismo e dará um toque de qualidade superior ao seu trabalho. Acima de tudo, pesquise muito. Estude, pergunte, duvide, investigue, confirme… Não só quando não sabe, mas também quando acha que sabe!
Não basta procurar, é necessário saber procurar. Quando tiver uma dúvida, não se contente com a primeira resposta que aparecer. Mais do que uma resposta, precisa da resposta correta. Por exemplo, no caso de fazer uma pesquisa na Internet por um determinado termo, confirme que as entradas são para português de Portugal e não para português do Brasil (no caso de traduzir para português europeu); se a fonte é de uma entidade reconhecida a nível nacional ou internacional; se são muitas as entradas a confirmar a sua suspeita… Recorra a dicionários fidedignos. Consulte o site do cliente (quando aplicável). Como em tudo na vida, seja seletivo e esteja sempre pronto para justificar a sua opção.
Talvez traduzir seja um pouco como aprender a conduzir. As técnicas aprendem-se na formação, mas apenas a experiência nos dará a versatilidade e os conhecimentos necessários para evoluirmos enquanto profissionais. Por vezes, a condução é pacífica; outras vezes, acontecem acidentes. Por isso, nada melhor do que nas primeiras viagens ter alguém ao seu lado. Aconselhe-se com profissionais da área com mais experiência. Poderá ser um colega de profissão, um professor, uma chefia no local de trabalho. Ouça a voz da experiência. A atenção ao pormenor e a elasticidade mental numa tradução são aspetos que se treinam; por isso, não desanime se alguém enumerar uma lista de pontos a melhorar. Faz parte do processo. Aceite as críticas que lhe fizerem e ganhe asas para voar. O destino é seu!
Certamente, já perdeu a conta ao número de vezes que alguém lhe disse para ler o original sempre antes de começar a traduzir. Bons conselhos! De facto, deverá ler e, porque não, reler o texto a traduzir antes de começar a trabalhar. Isto é tanto mais importante dado que está em início de carreira. Mas lembre-se, sempre (sempre!) antes de entregar o trabalho final ao cliente, leia e releia a versão final. Certifique-se de que está fiel ao original, de que não tem erros ortográficos, de que a formatação obedece ao original; em suma, de que não falta uma vírgula (literalmente falando). Demonstrará profissionalismo e ainda ganha o reconhecimento do cliente. Um ponto a seu favor!
Acima de tudo, deve respeitar o cliente. Lembre-se sempre de quem lhe paga. Antes de aceitar um trabalho, certifique-se de que compreende todas as exigências que lhe forem apresentadas e de que está em condições de as cumprir. Depois, cumpra apenas com a sua obrigação. Seja em termos de prazos de entrega do trabalho final, seja em termos de qualidade, seja em termos de condições específicas da tradução, respeite o que lhe for pedido. Como é natural, se lhe pedirem confidencialidade do conteúdo, não poderá anunciar ao mundo a descoberta interessante realizada em cuja tradução da patente está a trabalhar, por exemplo. Repito: lembre-se sempre de quem lhe paga!
Se não se sentir confortável com uma determinada temática que lhe propõem traduzir, se considerar que as condições de tradução não são as melhores ou se achar que se estão a aproveitar da sua inexperiência, aprenda a dizer “Não”. Não é porque está em início de carreira que tem de aceitar tudo. Conheça os seus limites e valorize-se. Afinal de contas, o profissionalismo não se mede pelos anos de experiência. Acima de tudo, já é um profissional de direito próprio.
Para tudo na vida, é importante investir. Lamento se não era isto que pretendia ouvir, mas a verdade é que não deixa de ser um facto. Seja na aprendizagem de conhecimentos, na aquisição de ferramentas ou ainda no convívio com colegas de profissão (preferencialmente os três em conjunto), tudo é fonte de enriquecimento. Num mundo como o nosso, revolucionado pelas novas tecnologias e em constante mudança, é fundamental estar sempre a par das últimas atualizações: uma boa formação, um programa inovador que o ajuda a otimizar o seu tempo, uma ferramenta capaz de lhe disponibilizar de imediato projetos antigos de uma temática específica, uma técnica de tradução invulgar, uma base terminológica complexa… Contudo, não se esqueça de investir também em relações humanas. Nelas se escondem, muitas vezes, respostas que nem sabe estar à procura! Invista; se não o fizer, facilmente sentirá que ainda agora começou e já está desatualizado.
Como em tudo na vida, não desista à primeira contrariedade. O mercado da tradução é vasto, mas difícil e altamente imprevisível. Sobretudo se for tradutor freelancer, passará por períodos de maior “estagnação”, não sabendo o que o futuro lhe reserva. Persista, envie currículos, efetue testes de tradução, dê o seu melhor e, se necessário, torne a persistir, a enviar currículos, a efetuar testes de tradução e a dar o seu melhor. Ninguém prometeu que seria fácil, apenas que no “tentar está o ganho”!
Por último, se tem de passar o resto da vida a fazê-lo (ou, pelo menos, a tentar), ao menos que goste do que faz e que valha a pena. A tradução tem este encanto de colocar uma série de temas e percursos à nossa frente. Nem sempre será fácil escolher, mas, na medida do possível, especialize-se em temas do seu agrado, pois é nesses que terá uma maior capacidade de fazer um bom trabalho. Serão também esses temas que lhe darão satisfação e realização pessoal e profissional.
8 Comments
Parabéns pelo artigo. Muito pertinente.
Muito obrigado, Tina!
Poxa, que artigo interessante, estou em início de carreira e gostaria de saber um pouco mais sobre as exigÊncias para ser um tradutor em Portugal, Onde poderia procurar essa informação? Preciso ter licenciatura em Letras? ou somente um excelente conhecimento e um curso de formação bastam?
Parabéns pelo artigo
Olá, Alik!
Muito obrigado pelo teu comentário!
Para obter informações sobre a atividade de tradutor em Portugal, sugerimos que contacte uma associação de profissionais de Tradução (como, por exemplo, a APTRAD).
Votos de sucesso!
Que artigo interessante! Adorava saber mais sobre o seu percurso seria uma grande ajuda visto que me encontro a iniciar o 2ºano de licenciatura em Tradução. Agradecia imenso um feedback.
Obrigada
Olá, Lisandra! Muito obrigado pelo teu comentário!
Os nossos artigos são escritos por vários elementos da nossa equipa, cada um deles com histórias profissionais bem diversificadas – o que é ótimo, pois significa que as possibilidades que tens pela frente são imensas!
Regularmente, vamos publicando textos sobre as experiências que os nossos tradutores e revisores vão vivenciando. O que te aconselhamos é que vás seguindo o blogue e as nossas redes sociais – deste modo, irás descobrindo um pouco mais sobre o percurso de cada um e poderás participar nas conversações que se vão gerando. Além disto, e caso tenhas perguntas específicas, poderás enviar-nos um e-mail para info@smartidiom.pt
Mais uma vez, muito obrigado e votos de muito sucesso!
Olá, eu adorei o artigo! E gosto muito da área pelo que com o incentivo deste artigo vou tentar isto para a minha vida.
Queria fazer uma questão será que existem tradutores sem licenciatura?
Parabéns pelo artigo! Muito motivador.
Olá, Maria! 🙂
Obrigada pelo comentário. É uma bela questão, de facto. Pode procurar contactar uma associação do sector, como a APTRAD, por exemplo, para tentar saber mais sobre essa questão. No que diz respeito à SMARTIDIOM, para podermos fornecer um serviço de acordo com a norma ISO 17100:2015 temos de garantir que os nossos tradutores internos e externos têm as devidas competências, adquiridas através de, pelo menos, um dos seguintes critérios:
a) Formação superior em Tradução (diploma reconhecido), ou outra designação desde que inclua formação em Tradução;
b) Qualificação equivalente em qualquer outra área, acrescida de, no mínimo, dois anos de experiência comprovada na prática da Tradução (a tempo inteiro);
c) Pelo menos cinco anos de experiência profissional comprovada na prática da Tradução (a tempo inteiro).
No caso de não possuir licenciatura, o linguista que cumpra com o ponto c) pode perfeitamente candidatar-se a trabalhar connosco.
Uma excelente semana!